Olá, camaradas, salve!
Depois de acumular uma certa distância emocional de determinados referentes temos uma tendência a esquecer o que fez afastarmo-nos deles...
Tento explicar isso agora, falando do natal...
Não sei se consegui também ignoro se pretendia mesmo conseguir, ou explicar, enfim, a verdade é que isso tudo me dói, certas dores deveriam ser deixadas em paz, acho...
Se alguém aí conseguiu, me dê a receita...
Vai a de hoje, cética, mas de bom grado:
POR QUE O NATAL ME DÓI?
(Para Itamar e Marcelina, Luis e Carmem).
Olsen Jr.
Em uma tarde destas, logo após as chuvas, estava num mercado aqui na Lagoa, buscava um tipo de requeijão que meus avós faziam. Uma maneira creio, de estreitar minhas saudades com um passado de quando tudo ia bem. Ao meu lado um casal procura algo na mesma gôndola. Não pude deixar de ouvir o comentário que o marido fez para a mulher, “essas músicas de natal são um saco”. Presto atenção e ouço uma versão em português, muito ruim da música “Happy Xmas (War is Over)”, do John Lennon. A letra era mais longa que a melodia, doía mesmo ouvir aquilo.
Tinha uma versão audível com a Simone. Melhor mesmo era ouvir o original com o ex-beatle. Caso raro de uma música de natal que ainda faz sucesso fora da data para a qual foi composta.
Lembro de um mês de dezembro, entre 1966 e 1969, em Chapecó em que ficava em uma sala lendo a obra infantil (17 volumes) de Monteiro Lobato enquanto a minha mãe arrumava a casa e ouvia músicas de natal. De tal maneira isso ficou no inconsciente que, todas às vezes que pego a literatura infantil do Monteiro Lobato já começo a ouvir “...Eu pensei que todo mundo fosse filho de papai-noel”... As músicas eram brasileiras, muito boas. Versos simples de grande apelo aos sentimentos. Li em algum lugar um ensaio crítico sobre o tema do natal, e as nossas composições sobressaiam-se sobre os outros países, notadamente os Estados Unidos, que era o referente com o indefectível “Jingle Bells”.
Meus avós, Eugênio Harald e Rosa Cabral eram católicos praticantes. Acreditavam em Deus e na unidade familiar. O natal, portanto, era uma data celebrada com todo o ritual que a ocasião exigia. Uma árvore era cortada no campo (já era plantada para essa finalidade), enfeitada com velas, algodão, bolinhas, anjos, estrelas, barba de velho tirada no mato, e embaixo, um presépio com a manjedoura, a criança recém nascida, Maria e José, os reis magos, enfim, tudo lembrando o que deveria ter sido quando o filho de Deus veio ao mundo.
O papai-noel chegava, fazia sua prédica, as orações de praxe, minha tia começava a cantar “Noite Feliz”, quem sabia a letra acompanhava e só mais tarde os presentes eram distribuídos. Depois, uma ceia, também precedida de agradecimentos e uma oração, e a festa que ia até o amanhecer.
No dia seguinte havia um churrasco de ovelha, e apareciam outros membros da família, chegavam para confraternizar. Era um clã numeroso, unido, feliz. Os almoços não tinham fim, o velho gene viking, ou nórdico recessivo, aflorava. Os adultos passavam o dia à mesa, bebendo cerveja, comendo, conversando... Vinha o café... Chegava o jantar e ninguém tinha arredado o pé ainda do lugar. Música contemplando vários gostos, mas imperava o velho nativismo gaúcho.
Bem, como nada dura para sempre, aquela tertúlia familiar também não durou. Estávamos saindo da adolescência quando meus avós morreram... Nunca mais foi a mesma coisa. Tentamos prosseguir com o ritual, mas parece que a essência tinha esvaído... A família foi se distanciando... Depois os meus pais também morreram... Foi então que eu me tornei arredio porque a reunião significava prantear os ausentes, na cabeça de um poeta isso é uma tortura... Olhar aquela mesa na sala, onde várias gerações tinham passado à cabeceira ninguém mais para agradecer o pão em nome de todos, ninguém mais para apaziguar a nossa ansiedade diante da franqueza do bom velhinho que parecia conhecer todas as nossas travessuras, e daquele coração gigante que nos compreendia sempre, desde que prometêssemos não reincidir nos erros... Prometíamos claro, mas sempre fazíamos tudo de novo, e éramos perdoados novamente com a vigilância bondosa e serena do meu avô.
É por isso que o natal me dói... Porque já não posso dizer para aqueles que me amaram, de verdade, que também os amava do meu jeito tímido, como são os poetas!
Tinha uma versão audível com a Simone. Melhor mesmo era ouvir o original com o ex-beatle. Caso raro de uma música de natal que ainda faz sucesso fora da data para a qual foi composta.
Lembro de um mês de dezembro, entre 1966 e 1969, em Chapecó em que ficava em uma sala lendo a obra infantil (17 volumes) de Monteiro Lobato enquanto a minha mãe arrumava a casa e ouvia músicas de natal. De tal maneira isso ficou no inconsciente que, todas às vezes que pego a literatura infantil do Monteiro Lobato já começo a ouvir “...Eu pensei que todo mundo fosse filho de papai-noel”... As músicas eram brasileiras, muito boas. Versos simples de grande apelo aos sentimentos. Li em algum lugar um ensaio crítico sobre o tema do natal, e as nossas composições sobressaiam-se sobre os outros países, notadamente os Estados Unidos, que era o referente com o indefectível “Jingle Bells”.
Meus avós, Eugênio Harald e Rosa Cabral eram católicos praticantes. Acreditavam em Deus e na unidade familiar. O natal, portanto, era uma data celebrada com todo o ritual que a ocasião exigia. Uma árvore era cortada no campo (já era plantada para essa finalidade), enfeitada com velas, algodão, bolinhas, anjos, estrelas, barba de velho tirada no mato, e embaixo, um presépio com a manjedoura, a criança recém nascida, Maria e José, os reis magos, enfim, tudo lembrando o que deveria ter sido quando o filho de Deus veio ao mundo.
O papai-noel chegava, fazia sua prédica, as orações de praxe, minha tia começava a cantar “Noite Feliz”, quem sabia a letra acompanhava e só mais tarde os presentes eram distribuídos. Depois, uma ceia, também precedida de agradecimentos e uma oração, e a festa que ia até o amanhecer.
No dia seguinte havia um churrasco de ovelha, e apareciam outros membros da família, chegavam para confraternizar. Era um clã numeroso, unido, feliz. Os almoços não tinham fim, o velho gene viking, ou nórdico recessivo, aflorava. Os adultos passavam o dia à mesa, bebendo cerveja, comendo, conversando... Vinha o café... Chegava o jantar e ninguém tinha arredado o pé ainda do lugar. Música contemplando vários gostos, mas imperava o velho nativismo gaúcho.
Bem, como nada dura para sempre, aquela tertúlia familiar também não durou. Estávamos saindo da adolescência quando meus avós morreram... Nunca mais foi a mesma coisa. Tentamos prosseguir com o ritual, mas parece que a essência tinha esvaído... A família foi se distanciando... Depois os meus pais também morreram... Foi então que eu me tornei arredio porque a reunião significava prantear os ausentes, na cabeça de um poeta isso é uma tortura... Olhar aquela mesa na sala, onde várias gerações tinham passado à cabeceira ninguém mais para agradecer o pão em nome de todos, ninguém mais para apaziguar a nossa ansiedade diante da franqueza do bom velhinho que parecia conhecer todas as nossas travessuras, e daquele coração gigante que nos compreendia sempre, desde que prometêssemos não reincidir nos erros... Prometíamos claro, mas sempre fazíamos tudo de novo, e éramos perdoados novamente com a vigilância bondosa e serena do meu avô.
É por isso que o natal me dói... Porque já não posso dizer para aqueles que me amaram, de verdade, que também os amava do meu jeito tímido, como são os poetas!
Olá, Celso, salve!
ResponderExcluirSoubesse que teria essa ilustração maravilhosa na crônica, talvez tivesse feito um texto mais otimista...
Na verdade, deixei a natureza, a minha claro, se manifestar, cética, cínica e eficiente, como diria o Paulo Francis.
Vai o meu abraço e aplauso para o teu trabalho e a tua família, a Margarete e a Anita.
Até
Olsen Jr.
Chorei lendo esta crônica, suponho minhas dores são semelhantes.
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