6 de mai. de 2009

As abelhinhas
do Sr. von Frisch


Por Amílcar Neves*

Tudo levaria a crer que, na semana que sucede à decisão do Campeonato Estadual de Futebol, o assunto seria a final de domingo. A desgraça desta crônica, porém, é que ela sai às quartas-feiras, quando, três dias após o embate, tudo já foi impresso, mostrado e dito sobre o jogo. Ainda que pudesse hoje - e eventualmente aqui - surgir alguma reflexão original sobre o tema, ela já não interessaria a mais ninguém, voltados que estamos, todos nós, a novos sucessos, a enredos mais recentes. De qualquer forma, como sabemos, ficou tudo azul.

Devido a esse formidável lapso, optou-se por um assunto de que pouco se falou nos últimos tempos: a inesgotável paciência que Herr Karl Ritter von Frisch demonstrou ao longo de 50 anos - Ritter, no caso, entendido como o título de Cavaleiro, ao invés de ser nome do meio: Senhor Carlos, Cavaleiro de Frisch (a Internet é fantástica!). Bem, tempo ele teve pra isso, pois morreu às vésperas dos 96 de idade. Sobraram-lhe ainda 46 anos para tratar da vida.

Um dia, von Frisch deu para reparar nas abelhas que produzem mel. Queria saber como a Cabral delas mandava comunicar a descoberta, avisar que tinha terra nova, isto é, flores e néctar, à disposição da colmeia, como informava a distância do tesouro e, especialmente, a direção em que ele se encontrava (para que suas colegas de trabalho não fizessem a besteira de sair para as Índias e dar com as fuças nas costas do Brasil).

Para tanto, Herr Frisch colocou duas taças com água e açúcar a distâncias diferentes da colmeia. As abelhas começaram a buscar a água açucarada em ambas. Ele, então, marcou com um ponto azul as abelhas que visitavam a taça próxima e, vermelho, a distante. Viram a utilidade da paciência? De volta à casa, as abelhas azuis "dançavam em círculo para avisar as companheiras", enquanto as vermelhas "faziam pequenos movimentos agitados". Quanto mais distantes eram postas as taças, mais aumentava o ritmo da dança das abelhinhas do Sr. von Frisch. Ao longo da tarde, o ângulo do plano da dança variava conforme o ângulo que o Sol descrevia no céu: isto definia a direção em que o alimento se encontrava.

Com isso, o zoólogo austríaco fundou uma ciência chamada Etologia, que estuda o comportamento dos animais, e, nove anos antes de morrer, ganhou o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina de 1973. Viram pra que serve a paciência?

*Amilcar Neves, escritor, residente em Florianópolis. Crônica publicada na edição de hoje (6.4) do jornal Diário Catarinense. Reprodução no Sambaqui na rede autorizada pelo autor.


Ilustração: Gallo Sépia.


Nenhum comentário:

Postar um comentário