26 de nov. de 2008

Mudança de hábitos - e de imagem (*)


Amílcar Neves

Lúcia Helena foi ao casamento de uma amiga, neste final de semana, no Rio Grande do Sul. Subiu no avião em Curitiba, onde mora, e chegou lá num instante. Em meio à inundação de notícias trágicas sobre as águas que tomam Santa Catarina desde o topo da serra até as bordas da planície litorânea, ela pegou dois dias de sol em Novo Hamburgo, passou por Porto Alegre debaixo de sol, chegou a Curitiba numa belíssima tarde ensolarada e quente de domingo.

Mônica e Amilcar Filho também foram ao casamento da Ana Paula. Saíram de Florianópolis no início da tarde de sexta-feira para estarem cedo com a amiga: aportaram às 11 da noite, depois de sofrerem o diabo com a chuva e o péssimo estado da estrada, em eterna e infindável duplicação, até Osório. No domingo à noite, em Lauro Müller, ao pé da Serra do Rio do Rastro, não tinham como seguir viagem para lado nenhum a fim de retornar a Florianópolis, onde trabalham. Atracaram em Tubarão para ver, na segunda, o que os fados diriam sobre condições de navegabilidade das estradas (encontraram uma fresta, um desvio da estrada bloqueada sobre o Morro dos Cavalos, em Palhoça, e conseguiram, apenas na parte da tarde, furar o bloqueio rodo-climático).

Netinho, caixa do banco, contava para os clientes em fila úmida na segunda de manhã: morando em Canasvieiras, 25 quilômetros ao Norte da cidade por dentro de Ilha, gastou três longas horas da sua vida para chegar, de ônibus, ao trabalho, pois uma verdadeira montanha desmanchou-se sobre a rodovia que liga o Centro às praias do Norte (é impressionante a foto da massa de terra e árvores que cobre a estrada). Dizem que um caminhão e dois carros que passavam por ali estão soterrados - e só Deus sabe quando poderão ser resgatados.

A verdade é muito clara: com o que ocorre em todo o Estado, no fundo a Capital é que ficou isolada, sem acesso pelo Norte, pelo Sul e pelo Planalto - e sem acesso dentro da própria Ilha. Como é ilha mas não tem porto, a cidade sequer pode ser alcançada pelo Oceano.

Ou seja: não temos estradas, não temos sol, não temos verão. Se nos resta a casa - muitos a perderam -, vamos pensar em atividades compatíveis com o que somos, dizer para ninguém mais vir para cá, especialmente de mudança, pois os morros caem sobre as cabeças das pessoas, e nos entreter com um bom livro em nossos muitos dias chuvosos, tempestuosos.

(*) Publicada no Diário Catarinense. Reprodução autorizada pelo autor

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