20 de nov. de 2008

CRIME AMBIENTAL NA PRAIA DO TOLÓ

Imagem de satélite em 28 de novembro de 2003, praia do Toló (Sambaqui). O condomínio Recanto das Gaivotas está sendo erguido na parte central. A vegetação ainda estava preservada. Fonte: Google Earth.


Ação Civil Pública

nº 2006.72.00.004373-1/SC



Recanto das Gaivotas


Condomínio em obras na estrada geral de Sambaqui (rua Rafael da Rocha Pires, 3440, praia do Tolo). Empresa responsável: Al Hisan Agro-Pecuária Ldta (sede na rodovia Haroldo Soares Glavan, 4.985, Cacupe).


Pedido de abertura de Ação Civil Pública com expedição de liminar, encaminhado à Justiça Federal em 10 de maio de 2006, tendo por base o Procedimento Administrativo nº 2114/03 (MPF). O pedido foi feito pelo procurador da República em Florianópolis Walmor Alves Moreira.


Pleiteia a “demolição das obras já edificadas” e a “recuperação da área de preservação permanente degradada”.



Partes da ACP

Autor: Ministério Público Federal

Réus: Al Hisan Agro-Pecuária Ldta (Advogado: Antônio Carlos Brasil Pinto*), Fatma, IPUF, Marcelo Neves Guimarães, Daniela Lapoli Guimarçaes, Mário Henrique da Silva Pinho, Patrícia Althoff Richard, Andréa Helmy Lichtenstein, Eneida Soares de Macedo, Herman Pieter Christian Hensberge, Caixa Econômica Federal (CEF), Campos Pereira Consultoria e Investimentos Ltda, José João Muller Neto, Jaime Gonzalo Nowotny Carpio e Maria Helena Freitas.

(*) Ex-Promotor de Justiça de Santa Catarina, titular da área de meio ambiente do então Centro das Promotorias da Coletividade (CPC-MPE).


Os fatos

* “A AL HISAN AGRO-PECUÁRIA LTDA iniciou obras de implementação do loteamento Recanto das Gaivotas, localizado em imóvel de sua propriedade (matrícula nº 59.289, Livro nº 1-K, fl. 143, Cartório do 2º Ofício do Registro de Imóveis, Florianópolis), sem o pertinente licenciamento ambiental, conforme relata o Laudo Técnico exarado pelo IBAMA/SC: Observamos que na Licença Ambiental de Instalação, a FATMA exige que seja solicitada a Licença Ambiental de Operação – LAO, no prazo máximo de 12 meses a partir da data de concessão da LAI (Licença Ambiental de Instalação) a qual data de dezembro de 2001, ou antes da operação (funcionamento) da atividade. Salientamos que segundo o relato do Sr. José Sehbe, todos os lotes já foram vendidos. Informamos ainda que o referido condomínio não possui Licença Ambiental de Operação”.

* “Já o Laudo Pericial n° 811/05-SR/SC, apresentado de forma mais detalhada, narra a existência de obras que causaram danos ambientais à flora e à fauna locais, visto que a área encontra-se na proximidade da Estação Ecológica dos Carijós – ESEC, bem como está localizada entorno de 20 (vinte) metros da linha preamar máxima. Sendo caracterizado, portanto, ecossistema de restinga. Assim, o empreendimento obteve licenciamento ambiental da ré FATMA, exceto a Licença Ambiental de Operação, concedido em total desacordo com os dispositivos legais pertinentes”.

* "A área, localizada em ecossistema de restinga, é considerada área de preservação permanente (APP), conforme o art. 2º, f, do Código Florestal. Essa é a informação constante do relatório de vistoria da Superintendência da Polícia Federal em santa Catarina, anexa ao incluso PA 2114/03. Relata, o perito, em parecer de 26/09/2005, que: “(...) as porções do terreno mais próximas da praia, de relevo plano e constituição predominantemente arenosa estão associadas ao ecossistema de restinga arbórea e de transição deste para floresta ombrófila densa. Tais tipologias florestais indicam a existência de APP’s (conforme Resolução do CONAMA 3003/02). (grifou-se)”.

* “Não obstante se tratar de APP, o loteamento obteve, em 30/11/2001, licenciamento ambiental da FATMA, que emitiu Licença Ambiental de Instalação (LAI) nº 230/01/FATMA, aprovando o parcelamento da área total de 8.972,49 m² (oito mil, novecentos e setenta e dois metros e quarenta e nove centímetros quadrados). Sendo 4.934,03 m² (quatro mil, novecentos e trinta e quatro metros e três centímetros quadrados) destinados à área total de lotes; 1.380,22 m² (Um mil, trezentos e oitenta metros e vinte e dois centímetros quadrados) reservados ao sistema viário; 2.344,41 m² (dois mil, trezentos e quarenta e quatro metros e quarenta e um centímetros quadrados) destinados à área verde; e 313,83 m² (trezentos e treze metros e oitenta e três centímetros quadrados) destinados à área do sistema de transporte – Estrada Geral do Sambaqui. O órgão expediu, ainda, Autorização para Corte de Vegetação nº 051/01.”

* “Outras flagrantes irregularidades ainda são vislumbradas nos Laudos Técnicos confeccionados pelo IBAMA/SC e pela Polícia Federal. Tais quais, a área destinada à edificação apresenta estágio inicial de regeneração; a declividade do solo é acentuada, sendo suscetível, portanto, à erosão; o empreendimento é, em tese, potencialmente poluidor, causando impacto, causando impacto ao meio ambiente.”

* “Ressaltar-se, ainda, a existência de um prédio de dois pavimentos totalmente construído (lote 8) e outra obra encontra-se em fase de edificação (lote 10). Por fim, importante salientar que os réus já foram denunciados por crime ambiental em autos de nº 2005.72.00.005104-8. Tal ação, porém, encontra-se no aguardo pela realização de audiência.”


Frente do condomínio Recanto das Gaivotas, responsável também pela degradação da praia do Toló. (Foto em 17.11.2008)


Licenças irregulares

“[...] agiram os réus em total desacordo com a legislação ambiental vigente, perpetrando uma série de atos graves e Danosos ao meio ambiente, como implantação de loteamento sem licença, licenciamento irregular e não recuperação da área Degradada. Com relação à irregularidade do licenciamento ambiental, cumpre destacar, inicialmente, que o imóvel objeto do loteamento localiza-se em área de preservação permanente. É o que se percebe da leitura dos relatórios de vistoria nº 811/2005, elaborado pela Polícia Federal, em 26/09/2005 e do IBAMA, datados de 07/03/2003 e 06/02/2004. De acordo com esses documentos, verifica-se que o Loteamento Recanto das Gaivotas está localizado no ecossistema de restinga, considerado área de preservação permanente pelo Código Florestal (Lei 4771/65),

senão vejamos:

Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:

f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangue;

De outra banda, compete ressaltar que a área se situa no entorno da Estação Ecológica de Carijós, unidade de conservação federal, administrada e mantida pelo IBAMA, impondo-se a necessidade de parecer desse órgão para concessão de qualquer tipo de licenciamento. Da mesma forma, a Resolução 237/97, do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), impõe a necessidade de parecer do IBAMA para licenciamento ambiental em áreas de entorno de unidades de conservação federais:

Art. 4º - Compete ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, órgão executor do SISNAMA, o licenciamento ambiental, a que se refere o artigo 10 da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, de empreendimentos e atividades com significativo impacto ambiental de âmbito nacional ou regional, a saber:

I - localizadas ou desenvolvidas conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; no mar territorial; na plataforma continental; na zona econômica exclusiva; em terras indígenas ou em unidades de conservação do domínio da União. Diante disso, é patente que a licença ambiental emitida pela FATMA padece de absoluta nulidade, seja por se tratar de APP, seja por não prescindir de parecer o IBAMA”.


O pedido do MPF

“POSTO ISSO, requer o Ministério Público Federal:

1) o deferimento de liminar, inaudita altera parte, para que sejam embargadas as obras em fase de edificação, bem como seja proibida qualquer iniciação de construções no loteamento Recanto das Gaivotas;

2) também em caráter liminar, seja registrado, no Cartório do Registro de Imóveis do imóvel em que ocorreu o dano, informação acerca da propositura da presente Ação Civil Pública, bem como da futura sentença, dando-se ciência a terceiros interessados;

3) a fixação de multa cominatória no caso de descumprimento da liminar, em valor não inferior a R$ 1.000,00 (Mil Reais) diários, a ser revertido ao Fundo Nacional do Meio Ambiente, na forma do art. 13 da Lei nº 7.347/85;

5) seja a presente inicial recebida, e após, sejam os réus citados, na pessoa de seus representantes legais, sr. Rodrigo Nicola Sehbe e sra. Eleonora Nicola Sehbe, sócios da Al Hisan Agro-pecuária Ltda e sr. Sérgio José Grando, Presidente da Fundação do Meio Ambiente - FATMA, para, querendo, contestar a presente ação, sob as penas do art. 285 CPC, com aprazamento de audiência conciliatória prévia;

6) a intimação da União Federal e do IBAMA, a fim de que manifestem interesse em ingressar no feito sob a forma de litisconsortes ativos, na forma da lei;

7) a produção de todas as provas admitidas em direito, em especial, a juntada do incluso Procedimento Administrativo, bem como de outras provas que se fizerem necessárias para a tutela efetiva do meio ambiente;

8) a intimação pessoal e nos autos do processo do órgão do Ministério Público Federal de todos os atos processuais, com a remessa dos autos para a Procuradoria da República em Santa Catarina, situada na Rua Bulcão Viana, n.º 198, Centro, Florianópolis, Santa Catarina;

9) ao final, a procedência integral dos seguintes pedidos:

9.1) em relação à FATMA:

a) seja reconhecida a nulidade dos licenciamentos ambientais expedidos (LAI nº 089/01 e Licença para corte de vegetação nº 051/01), em decorrência da violação das normas ambientais vigentes, em especial, por se referir à área de preservação permanente e pela inexistência da participação do

IBAMA no procedimento de licenciamento, nos termos da Resolução CONAMA nº 237/97;

b) seja condenada à adoção de medidas tendentes à reparação dos danos ambientais provocados pela sua omissão administrativa, nos termos do item 9.2 “a” dos pedidos, sob pena de aplicação de multa diária a ser fixada em valor não inferior a R$ 1.000,00 (Mil Reais);

c) seja condenada ao pagamento de indenização, em decorrência dos danos ambientais provocados pela sua omissão, ao valor de R$ 15.000,00 (Quinze Mil Reais) a ser revertido em benefício do Fundo Nacional do Meio Ambiente, nos termos do art. 13 da Lei nº 7.347/85, com a determinação judicial para que o dinheiro seja revertido em favor de obras de proteção ao meio ambiente, nas regiões da Ilha de Santa Catarina; tudo sem Prejuízo da apuração das responsabilidades criminais e administrativas pertinentes;

9.2) em relação à AL HISAN AGRO-PECUÁRIA Ltda.:

a) seja reconhecida a prática dos danos ambientais narrados nesta inicial, implicando responsabilização civil, condenando-a à reparação dos mesmos, sob a forma de obrigação de fazer, consistente na adoção de Projeto de Reparação de Área Degradada – PRAD, a ser submetido à aprovação do IBAMA, e implantado em prazo não superior a 180 dias sob pena de Aplicação de multa diária a ser fixada em valor não inferior a R$ 1.000,00 (Mil Reais);

b) a condenação ao pagamento de indenização em decorrência dos danos patrimoniais ambientais já provocados ao meio ambiente e da impossibilidade de retorno ao statu quo ante, em valor a ser apurado em perícia, a ser revertido em benefício do Fundo Nacional do Meio Ambiente, na forma do art. 13 da Lei nº 7.347/85, com determinação judicial para que o dinheiro seja revertido em favor de obras de proteção ao meio ambiente, nas regiões da Ilha de Santa Catarina;

c) a condenação ao pagamento de indenização a título de dano moral ambiental, em decorrência dos danos extrapatrimoniais provocados à coletividade, no valor de R$ 50.000,00 (Cinqüenta Mil Reais), a ser revertido em benefício do Fundo Nacional do Meio Ambiente, na forma do art. 13 da Lei nº 7.347/85, com determinação judicial para que o dinheiro seja revertido em favor de obras de proteção ao meio ambiente, nas regiões da Ilha de Santa Catarina;

10) sejam os réus condenados, ainda, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios;

11) a remessa de cópias da futura decisão, para ciência, ao Ministério Público do Estado de Santa Catarina, à Prefeitura Municipal de Florianópolis, à Polícia Ambiental, à CASAN e à CELESC.


Andamento

* Em fevereiro de 2007 surgiu a primeira decisão com negativa do pedido de liminar, sendo a ACP acatada.

Decisão

1. Intimem-se as partes para que se manifestem sobre o pedido da União de ingresso no feito na condição de assistente litisconsorcial da parte autora.

2. Indefiro, por ora, os pedidos liminares tendo em vista o longo tempo decorrido entre a data dos fatos e a propositura da presente demanda e principalmente pela falta de indicação concreta de novos fotos que coloquem em risco a tutela do meio ambiente até a regular instrução, como novas construções.

3. Citem-se os demais réus.

Florianópolis, 05 de fevereiro de 2007.

Zenildo Bodnar

Juiz Federal Substituto na Titularidade Plena

* Última manifestação da Justiça Federal. Juíza Federal Substituta Marjôrie Cristina Freiberger Ribeiro da Silva.


Despacho/Decisão

1. Trata-se de ação civil pública visando à demolição de obras e recomposição de área degradada em virtude da implantação do Loteamento Recanto das Gaivotas, no bairro do Sambaqui, nesta Capital, em área de preservação permanente. Os pedidos liminares foram indeferidos.

2. Manifestação do MPF de fl.605: mantenho a decisão de fl. 578 que indeferiu a liminar.

3. Citem-se os litisconsortes passivos necessários relacionados às fls. 557/558, atentando-se para o endereço de um deles indicado na petição de fl. 605.

4. Decorrido o prazo das contestações, intime-se o Ministério Público Federal para se manifestar, querendo, no prazo de 10 (dez) dias, bem como para falar sobre o pedido de assistência formulado pelo IBAMA (fl. 441) e, desde já, indicar as provas que pretende ainda produzir, justificadamente.

5. Após, intimem-se os réus para, no prazo de 05 (cinco) dias, manifestarem-se sobre o pedido de assistência formulado pelo IBAMA, bem como para, também, no mesmo ato, apontar as provas que pretendem ainda produzir, justificadamente.

6. Corrija-se a autuação, para que os litisconsortes passem a constar no pólo passivo da relação processual.

7. Proceda a Secretaria à anotação, na contracapa, da ação penal existente sobre o mesmo objeto.

Florianópolis, 03 de novembro de 2008.

Marjôrie Cristina Freiberger Ribeiro da Silva

Juíza Federal Substituta”.


Acompanhe o andamento da ACP no site da Justiça Federal em Florianópolis (http://www.jfsc.gov.br/). Vá em Consulta Processual Unificada e no item Nº do Processo digite 20672000043731 (nº da ACP).

2 comentários:

  1. Eu como morador e frequentador fico muito, mais muitoo triste!

    Eu que achava que o dinheiro em sambaqui nao tinha poder!

    Abraço

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  2. A foto é do condomínio sambaqui.
    Vá se imformar antes de falar e criar blogs.

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